A 021 Inovação nasceu em 2014 com uma antecipação de cerca de 3 anos e uma mudança nas atividades iniciais: queríamos criar uma empresa para trabalhar com desenvolvimento de jogos/aplicações para o mundo empresarial, mas a empresa foi criada para atender projetos de automação de software a partir de um freela que virou um negócio.

O parto sofrido de uma empresa no BrasilO nascimento foi muito sofrido. Não pela falta de clientes ou de grana, mas por um fator já conhecido por qualquer brasileiro: a burocracia. E tanto pública quanto privada – esta última quase me deixou louco e é o principal foco deste texto.

Em um cenário comum de criação de empresa, temos um fluxo (macro!) mais ou menos assim:

  1. Definimos o que a empresa fará
  2. Abrimos a empresa
  3. Abrimos uma conta corrente no banco
  4. Conseguimos nossos clientes
  5. Vendemos nossos produtos/serviços
  6. Emitimos as notas fiscais
  7. Recebemos dos clientes

No caso da 021 Inovação, a ordem foi mais ou menos assim:

  1. Conseguimos nossos clientes
  2. Vendemos nossos produtos/serviços
  3. Abrimos a empresa
  4. Abrimos uma conta corrente no banco
  5. Emitimos as notas fiscais
  6. Recebemos dos clientes
  7. Definimos o que a empresa fará

Os passos 1 e 2 estavam concluídos. Parece ótimo, certo? Conseguir a primeira venda antes mesmo da empresa existir oficialmente? Sim, seria ótimo se as coisas em nosso país fossem mais dinâmicas e os processos não fossem tão arcaicos. Do passo 3 ao 6 foi um desespero… Vários desesperos para ser mais correto.

Esta mudança na ordem “natural” das coisas causou uma série de furdúncios porque, após a primeira venda, nos vimos na seguinte situação:

  1. O cliente precisava dos dados da empresa (inclusive bancários) para cadastrar a 021 Inovação como fornecedor e iniciar o processo de contratação.
  2. Precisávamos da empresa constituída para emitir a nota fiscal de entrada do projeto para formalizar o início dos trabalhos.
  3. O banco precisava dos dados da empresa para abrir a conta corrente.

Apesar do trabalho sensacional do escritório contábil que nos atende para abrir a empresa, esbarramos em cenários de greve em setores públicos que atrasaram demais o processo de abertura. E quando as greves acabaram, houve mais demora devido ao volume altíssimo de solicitações que ficaram acumuladas.

Com CNPJ criado e registros realizados nos órgãos competentes, iniciamos a saga de abrir a conta corrente no banco. Sem isso, ainda não seria possível ser cadastrado como fornecedor de nosso cliente.

Os dois primeiros bancos que fomos não conseguimos ser atendidos pelo gerente porque o CNPJ era muito recente. Precisava ter pelo menos 1 ano.

Fui ao banco em que sou correntista como pessoa física (acreditando que poderia ter alguma vantagem). Consegui ser pelo menos recebido. O primeiro diálogo com a gerente, de forma resumida, foi mais ou menos assim:

[Gerente] Seu CNPJ é muito novo… É arriscado para o banco criar uma conta corrente para sua empresa.

[Leo] Mas eu só preciso da conta corrente. Não quero nenhum outro produto. Já possuo clientes e dinheiro para depositar…

[Gerente] Você pode enviar o faturamento dos últimos dois anos?

[Leo] Não… Porque a empresa foi aberta este mês…

[Gerente] Entendo. Você pode enviar uma previsão de faturamento dos próximos 6 meses? Um contador precisa assinar. Sem isso, será difícil ter autorização.

E em contato com nosso escritório de contabilidade:

[Contador] Para uma previsão de faturamento para os próximos 6 meses, precisamos ter como base o faturamento dos últimos 12 meses.

[Leo] Mas a empresa foi aberta este mês. Por vocês. Não temos isso ainda.

[Contador] Podemos fazer com base no contrato de prestação de serviços com algum cliente.

[Leo] Ainda não podemos fechar contrato com o cliente, pois precisamos da conta bancária, que somente será aberta se tivermos essa previsão de faturamento para os próximos 6 meses…

No fim das contas, após algumas idas e vindas, nosso escritório contábil gerou o documento necessário com base na proposta comercial aprovada pelo cliente.

De volta ao banco:

[Gerente] Ainda estamos reticentes em abrir a conta corrente para sua empresa. Seria preciso melhorar o relacionamento com o banco.

[Leo] Como assim?

[Gerente] Você precisaria adquirir um de nossos produtos.

[Leo] Tipo?

[Gerente] Cartões de crédito.

[Leo] Ok. Pode ser um.

[Gerente] Vou colocar um de cada bandeira.

[Leo] Ok…

[Gerente] Consórcio de carro?

[Leo] Não dirijo.

[Gerente] De casa?

[Leo] Acho mais vantajoso aluguel…

[Gerente] Nesse caso, fica complicado iniciar um relacionamento.

[Leo] Então não será possível abrir?

[Gerente] Você poderia… Adquirir um consórcio de um carro, pagar a primeira parcela e cancelar no mês seguinte. Eu pontuo, meu time pontua e você fica isento da taxa de abertura da conta.

Depois do sangue ferver algumas vezes, me vendo em um beco sem saída e com zero paciência para procurar outro banco… aceitei. Com muita tristeza. Não pelo dinheiro em si que foi embora, mas por me sentir totalmente extorquido por uma instituição que é um ator importantíssimo no fomento do empreendedorismo.

Depois desta maratona traumática, conseguimos completar todos os passos de nosso fluxo.

Sei que alguns teriam mais fibra/vontade e lutariam por seus direitos, buscariam outros bancos e se associariam somente aos que oferecessem serviços justos. Optamos por engolir este sapo para que a empresa nascesse de vez. Já estávamos no terceiro banco, falando com a vigésima pessoa… Todos os bancos já estavam no mesmo saco.

Até quando teremos essas barreiras imensas que não agregam em nada quem tenta empreender no Brasil? Quantas pessoas capazes e com excelentes ideias não devem morrer na praia exaustas pelas ondas de burocracia?